Doenças do tecido conjuntivo

Doenças do tecido conjuntivo associadas à doença pulmonar intersticial

O texto foi baseado nas recomendações ERS/EULAR de 2025.

European Respiratory Society (ERS)

European Alliance of Associations for Rheumatology (EULAR)

Introdução

A doença pulmonar intersticial (DPI) é uma das manifestações mais frequentes em doenças do tecido conjuntivo (DTCs) e está associada a alta morbidade e mortalidade.

Avaliam-se doenças como: esclerose sistêmica (ES), miopatias inflamatórias idiopáticas (MII) e outras DTCs, incluindo doença de Sjögren (DSJ), lúpus eritematoso sistêmico (LES) e doença mista do tecido conjuntivo (DMTC). Artrite reumatoide (AR) sob o termo genérico DTC nesta diretriz.

Triagem

O rastreamento é importante para o diagnóstico precoce da DPI, permitindo intervenções precoces. Ferramentas de rastreamento ideais e orientações sobre a frequência com que os pacientes devem ser rastreados são essenciais.

Usar como método de escolha a tomografia computadorizada (TC) em vez de teste de função pulmonar (TFP) e ultrassonografia pulmonar para o rastreio.

Isso se deve ao fato de que os TFPs não foram capazes de identificar aqueles com e sem DPI com precisão suficiente se forem usados ​​como única ferramenta de rastreamento.

A não identificação de DPI em pacientes com DTC está associada à perda de oportunidade de intervenção e ao aumento da mortalidade e morbidade. Dada a alta prevalência de DPI em ES e MII, e que a DPI não diagnosticada está associada a morbidade e mortalidade significativamente maiores, o risco de não se identificar o diagnóstico é grande demais para justificar o rastreamento apenas por TFPs. A não identificação de DPI em qualquer paciente com AR e outras DTCs está associada à perda de oportunidade de intervenção e ao aumento da mortalidade e morbidade.

O uso isolado da ultrassonografia pulmonar pode levar a resultados falso-negativos, nos quais os pacientes enfrentariam um atraso no início do tratamento recomendado, resultados falso-positivos, nos quais os pacientes poderiam ser submetidos a exames e/ou tratamentos desnecessários, e à baixíssima certeza das evidências.

Todo paciente com esclerose sistêmica deve ser rastreado para DPI usando TC.  A prevalência de DPI é alta na ES e nenhum dos fatores de risco está definitivamente ligado à presença ou ausência de DPI. Limitar o rastreamento a um subconjunto de pacientes resultaria na não detecção de um número significativo de casos de DPI, o que resultaria em aumento da morbidade e mortalidade.

Nos pacientes com artrite reumatoide, realizar o rastreio naqueles com fatores de risco para DPI, incluindo idade avançada, histórico de tabagismo, fator reumatoide (FR) elevado, anticorpos antipeptídeo cíclico citrulinado (anti-CCP), aumento de marcadores inflamatórios, sexo masculino e alta atividade de doença articular.

Nos pacientes com miopatia inflamatória, realizar rastreio de DPI naqueles com fatores de risco, incluindo síndrome antissintetase, dermatomiosite clinicamente amiopática, presença de mãos de mecânico, artrite e certos autoanticorpos associados à miosite (antissintetase, anti-gene 5 associado à diferenciação de melanoma (anti-MDA-5) e anti-Ro52). Uma recomendação condicional seria rastrear todos os pacientes com MII, exceto aqueles com miosite por corpos de inclusão.

Todos os pacientes com doença mista do tecido conjuntivo devem fazer rastreio para DPI.

Nos pacientes com Doença de Sjögren, realizar rastreio de DPI naqueles com fatores de risco (idade avançada, sexo masculino, envolvimento ativo de órgãos extrapulmonares e aumento de marcadores inflamatórios).

No LES, devido à prevalência muito baixa de DPI e à experiência clínica limitada, não foi fornecida uma recomendação sobre quais pacientes com LES devem ser submetidos à triagem.

Diagnóstico

No momento do diagnóstico de DPI em pacientes com DTC, é importante avaliar a gravidade da doença e o risco de progressão para individualizar o tratamento. Por isso é importante conhecer os fatores de risco para doença pulmonar de cada doença e avaliá-los em todos os pacientes.

O lavado broncoalveolar deve ser usado em casos de suspeita de infecção ou para excluir diagnósticos alternativos.

A biópsia pulmonar não desempenha papel no diagnóstico (riscos potenciais e à atual falta de evidências claras de que possa melhorar ou afetar o diagnóstico).

O teste de caminhada e PROMs deve ser utilizado nos pacientes que não apresentarem contraindicações.

O teste de caminhada avalia a gravidade e/ou prognóstico de DPI em pacientes com ES-DPI, para pacientes com AR-DPI com dano articular limitado ou inexistente nos membros inferiores ou sinovite ativa, para MII-DPI sem envolvimento muscular significativo dos membros inferiores e para outras DTC-DPI.

PROMs para avaliar a carga de sintomas e doenças, bem como as necessidades dos pacientes, a fim de avaliar a gravidade da DPI.

Na esclerose sistêmica, realizar TC, testes de função pulmonar (CVF e DLCO), autoanticorpos, envolvimento da pele (extensão e progressão) e marcadores de inflamação (PCR e/ou VHS) para identificar pacientes com DII-ES com maior risco de progressão.

Na artrite reumatoide, avaliar o padrão da DPI (pneumonia intersticial usual (PIU), sendo mais comum) e a extensão na TC e nos testes de função pulmonar (CVF e DLCO).

Na miopatia inflamatória, realizar TC, testes de função pulmonar (FVC e DLCO) e perfil de autoanticorpos (anticorpo anti-MDA-5, anticorpos antissintetase, anticorpo anti-Ro52).

Monitoramento

Prova de função pulmonar: a cada 3-6 meses nos primeiros anos (durante os primeiros 3–5 anos na ES; 1-2 anos na AR; primeiro ano na MII e nas outras DTC) e, após, a cada 6-12 meses.

Tomografia computadorizada: repetir o exame a cada 1-2 anos, exceto nos pacientes com miopatia inflamatória, em que esse intervalo pode ser reduzido para a cada 6 meses, naqueles com fatores de risco maior nos primeiros 2 anos de doença.

Repetir os exames a qualquer outro momento se o paciente apresentar sintomas clínicos que podem sugerir progressão.

Tratamento

O objetivo do tratamento é prevenir a progressão da doença, melhorar os sintomas, a qualidade de vida e a sobrevida.

Realizar o uso de tratamento imunossupressor em pacientes com AR, MII, DSj, DMTC e LES-DPI.

Esclerose Sistêmica: sugerido o uso do micofenolato em pacientes com DPI. O tocilizumabe pode ser considerado naqueles pacientes com acometimento cutâneo difuso precoce associado a DPI e marcadores inflamatórios aumentados ou progressão cutânea. Ciclofosfamida ou rituximabe também são opções de imunossupressão em pacientes com DPI associada a ES. Considerar terapia combinada nos casos com alto risco de progressão ou refratários. Nintedanibe nos casos de fibrose pulmonar em mais de 10% nas TC de tórax ou com alto risco de progressão. Considerar transplante pulmonar nos casos severos, refratários.

Miopatia inflamatória: o tratamento imunossupressor demonstrou melhorar tanto a sobrevida quanto a função pulmonar. A intervenção imediata com imunossupressão deve ser considerada para pacientes com MII-DPI, com a escolha dos agentes adaptada a cada paciente com base na gravidade e na progressão de DPI. Sugerida terapia combinada com imunossupressores, incluindo glicocorticoides, associados a opções como: azatioprina, micofenolato, ciclofosfamida, rituximabe, inibidores de calcineurina (CNI), imunoglobulina humana (IVIG), inibidores da JAK (iJAK). Em casos rapidamente progressivos, considerar: ciclofosfamida ou rituximabe associado a CNI, IVIG e iJAK (plasmaférese pode ser considerada). Em casos de fibrose progressiva, associar nintedanibe. Considerar transplante pulmonar nos casos severos, refratários.

Artrite reumatoide: nos pacientes com quadro articular em atividade, opções nos casos de DPI associado: abatacepte, rituximabe, inibidores da JAK, tocilizumabe. Micofenolato pode ser uma opção para acometimento pulmonar com quadro articular estável. Combinação de imunossupressores em casos graves ou progressivos. Nintedanibe em pacientes com fibrose pulmonar progressiva. Uma outra opção sugerida é a pirfenidona nos pacientes com padrão de PIU. Considerar transplante pulmonar nos casos severos, refratários.

Nas outras doenças do tecido conjuntivo, algumas opções de imunossupressão são micofenolato, azatioprina, rituximabe e ciclofosfamida. Combinação de imunossupressores em casos com alto risco de progressão ou severos. Nos pacientes com fibrose pulmonar progressiva, associar nintedanibe.

Referência

Antoniou, Katerina M. et al. ERS/EULAR clinical practice guidelines for connective tissue diseases associated with interstitial lung disease. Annals of the Rheumatic Diseases, Volume 0, Issue 0.

 

Revisão Médica

Dr. Diego Nunes | Reumatologista 

CRM 192102 – SP

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